quarta-feira, 21 de março de 2012

Preto no branco?!

"Dia Internacional pela Eliminação da Discriminação Racial e de Combate ao Racismo"

Acho que está faltando um pouquinho mais de reflexão sobre como entendemos discriminação e diferença, pois isso tem gerado alguns debates equivocados, sobretudo no que se refere à questão no negro (imagino que o dia se dedique a outras situações também).

Enfim é complicado discutir essas questões sem cairmos na grande balela da escolha individual. Digo balela, pois em uma sociedade capitalista as escolhas são quase pré-concebidas. Como escolher entre a beleza negra ou a branca em um mundo onde os principais meios de comunicação e formação (mídia, escola, religião, etc) defendem interesses, ideologias e padrões estéticos, culturais e sociais brancos? Além do mais a ideia de que desejo, interesse ou admiração pelo corpo ou culturas negras por parte dos brancos são sinônimos de superação do racismo já não serve, principalmente quando entendemos que vivemos em um país que buscou lidar com o “problema” dos negros libertos por meio de uma política de branqueamento da população, baseada, dentre outros coisas, nas relações inter-raciais.

Precisamos entender ainda que nossas escolhas, pretensamente individuais, são perpassadas por ideologias, com as quais temos contato constantemente ao longo de nossas vidas. Crescemos vendo, ouvindo e sentindo o que é o belo, o feio, o certo, o errado, o sagrado, o profano e esses valores ajudam a nos entender no mundo, a nos inserirmos socialmente, a elaborar nossos interesses, expectativas, sonhos... Enfim nós somos constituídos por uma série de discursos dos quais nos apropriamos, rejeitamos, reproduzimos. Por isso mesmo não podemos colocar apenas na conta das escolhas individuais, do gosto, do desejo ou do amor fatos constitutivos da personalidade e da atitude do negro brasileiro em suas relações endogâmicas, como a rejeição dos negros pelos próprios negros; a incapacidade de sentir desejo, atração ou admiração pela própria raça; a negação de valores e das culturas de origem africana.

Dizer que o negro é mais racista não resolve nosso problema. Não podemos nos contentar em dizer que não nos amamos e pronto! Ninguém tem culpa! Não são alguns negros que agem assim. Não são apenas residuais os casos de negros que reproduzem discursos racistas, ao contrário, isso é um caminho quase lógico, quase único para nossa inserção em sociedade. Aceitar que o mundo ideal é branco não é uma atitude covarde ou individualmente fraca, é uma postura coletiva em consequência de um processo de esvaziamento político, cultural, econômico e social de uma enorme parcela da humanidade.

Crescer em uma sociedade que busca a pureza e as luzes e, por isso mesmo, associa a cor da nossa pele a tudo que é impuro, infeliz e sombrio nos leva a negar nossa história, nossas origens e, o mais cruel, nos faz rejeitar nosso próprio corpo, ora diretamente – alisando nossos cabelos, evitando desesperadamente o sol, disfarçando ou operando o nariz ou os lábios, etc – ora indiretamente, por meio da rejeição do corpo do outro – negando aquela beleza, buscando justificativas para nossa incapacidade de nos reconhecer belos e desejáveis, inviabilizando nossas construções familiares, etc.


Sei que esse tipo de debate é temeroso, sobretudo porque podemos cair em discursos fascistas de inversão da dominação e da opressão e não é isso que pessoas sérias e interessadas na discussão e "solução" da questão racial estão interessadas. Tampouco questionamos as escolhas individuais, o amor ou o desejo. O povo negro sempre foi privado de escolhas e de dispor de seus corpos ou mesmo de possuir qualquer sentimento humano, não seria lógico que continuemos sendo privados disso, agora por pressão de nossos irmãos. Porém precisamos ser críticos e perceber o mal que nos causamos ao nos negar, nos rejeitar e propagar ideologias que esvaziam a construção do racismo ao nos presentear com o cavalo de Tróia que é a possibilidade de escolha num mundo pré definido para atender interesses bem marcados.

Um comentário:

  1. Bacana o texto...as vezes temos que explorar mesmo este discurso de que podemos fazer escolhas individuas com relação ao nosso gosto e lutar contra essa baléla do sujeito racional q dirige sua vida...bjão nega!

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